Claudecy Oliveira Lemes é proprietário de 11 fazendas no Pantanal, dentre elas a “Soberana”, multada por desmatamento em 2020, e beneficiada com quatro operação de crédito rural pelo Banco do Brasil entre 2021 e 2022;

Investigação também mostra que Claudecy forneceu gado de duas de suas fazendas para a JBS em vários momentos entre 2020 e 2023;

Greenpeace Brasil pede revisão e cancelamento de operações de crédito rural para proprietários que praticam irregularidades socioambientais na Amazônia, Pantanal e demais biomas

Os dados da investigação do Greenpeace Brasil, imagens e documentos do caso estão disponíveis aqui.

Ato do Greenpeace Brasil em frente à sede do Banco do Brasil em Brasília
Crédito: Tuane Fernandes/Greenpeace Brasil

Um levantamento a partir de dados públicos realizado pelo Greenpeace Brasil revela que o Banco do Brasil concedeu mais de R$ 10 milhões em crédito rural ao fazendeiro Claudecy Oliveira Lemes, acusado de utilizar ilegalmente em suas fazendas no Pantanal agrotóxicos desfoliantes, dentre eles a substância 2-4-D – um dos componentes do “agente laranja”, utilizado na Guerra do Vietnã – para a prática de desmatamento químico de vegetação nativa. A investigação também revela que o fazendeiro forneceu gado para a JBS entre 2020 e 2023.

O caso do uso ilegal do componente do “agente laranja” no Pantanal veio à tona após uma reportagem veiculada no Fantástico em 14 de abril. Segundo a matéria, o fazendeiro teria utilizado os agrotóxicos em uma área gigante no município de Barão de Melgaço, no MT, com o objetivo de substituir a vegetação nativa por pastagens para a criação de gado. O caso chamou atenção do Greenpeace Brasil, que passou a investigar quais seriam os recursos financeiros de Claudecy. 

Claudecy Oliveira Lemos é proprietário de 11 fazendas no Pantanal. Durante o levantamento, uma das fazendas em especial levantou um alerta. Trata-se do imóvel rural “Fazenda Soberana”, que, em resumo, apresenta:

  • Auto de infração por desmatamento ilegal em uma área equivalente a 1.370 hectares aplicado pelo órgão SEMA/MT e lavrado em 2020, com uma multa de R$ 6.853.650,00;
  • Quatro financiamentos – que juntos somam mais R$10 milhões – concedidos pelo Banco do Brasil entre março de 2021 e março de 2022, ainda vigentes;
  • Venda de gado para a JBS em 2021, mesmo após a fazenda ser embargada por desmatamento;
  • Indícios de uso ilegal do fogo em 2023, com registro de uma área queimada estimada em 2.500 hectares dentro dos limites da fazenda.

Em um dos autos de infração emitidos em 2023 pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente/MT (Auto de Infração nº 1369000223), a “Fazenda Soberana” também aparece como receptora dos agrotóxicos possivelmente utilizados para a prática de desmate químico realizado nas fazendas vizinhas, todas de Claudecy.

Créditos do Banco do Brasil (BB) para fazenda com embargo

Segundo os dados apurados pelo Greenpeace, o pecuarista Claudecy acumula quatro contratos de crédito rural que juntos somam um total de R$ 10.017.840,00, com vencimentos entre 2027 e 2029. Todos eles foram concedidos pelo BB entre 2021 e 2022 à “Fazenda Soberana”, propriedade rural multada  por desmatamento ilegal pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente/MT em 2020. 

Em 2021, o BB concedeu três empréstimos a Claudecy para aquisição de 3 mil cabeças de gado. Em 2022, um novo empréstimo do BB foi concedido para a aquisição de um avião. 

O BB é personagem do relatório “Bancando a Extinção: bancos e investidores como sócios no desmatamento” – lançado em abril pelo Greenpeace Brasil – que denuncia como a falta de controle adequado dos bancos na concessão de crédito rural beneficia produtores rurais envolvidos com desmatamento, grilagem e demais irregularidades na Amazônia.

Uma vez que os quatro contratos ainda estão vigentes, o Greenpeace Brasil pede que o Banco do Brasil revise e cancele imediatamente tais financiamentos, pois o imóvel rural financiado está marcado por irregularidades ambientais.

Além da “Fazenda Soberana”, outras quatro fazendas de Claudecy no Pantanal foram objeto de embargo da SEMA/MT. Sete autos de infração foram registrados nessas propriedades rurais entre 2017 e 2021. No total, esses autos somam R$ 37.896.943,50 em multas aplicadas.

“Diante do tamanho dos danos ambientais causados por Claudecy, seja com o suposto uso dos agrotóxicos para o desmate químico, seja pelas demais irregularidades socioambientais em suas fazendas, o Banco do Brasil deve cancelar as operações de crédito vigentes e liquidar o empréstimo antecipadamente, tanto para se alinhar as regras atuais do Manual do Crédito Rural, como para evitar a continuidade dos prejuízos causados pelo fazendeiro”, recomenda a porta-voz da campanha de florestas do Greenpeace Brasil, Thais Bannwart.    

Venda de gado para a JBS

Dados apurados pelo Greenpeace Brasil também mostram que um ano após ser embargada por desmatamento ilegal, a “Fazenda Soberana” forneceu gado para a empresa JBS do município de Pedra Preta (MT) em 2021. Importante ressaltar que a fazenda se encontrava embargada pelo órgão estadual quando a compra foi realizada, mas isso não impediu a JBS de finalizar a transação.

“Antes de realizar a compra, a JBS tinha como saber que a fazenda estava embargada. Mais que isso, a empresa deveria buscar essa informação para cumprir com a sua própria política de compra, que afirma que o frigorífico não adquire animal de imóveis rurais com desmatamento não autorizado em todos os biomas a partir de 01/08/2019”, explica a coordenadora da campanha de florestas do Greenpeace Brasil, Cristiane Mazzetti.

Claudecy vendeu outros 106 lotes de gado para a JBS entre março de 2020 e maio de 2023 de uma outra fazenda. Apesar dela não ter embargos, chama a atenção que a “Fazenda Soberana” está distante apenas 128 km dessa fazenda e, na pecuária, é comum a prática de “lavagem de gado”, uma estratégia usada para driblar a fiscalização e o controle das cadeias de abastecimento, repassando os animais dos imóveis irregulares para os imóveis regulares antes de chegar ao frigorífico.

Demandas

No relatório “Bancando a Extinção: bancos e investidores como sócios no desmatamento”, o Greenpeace Brasil traz uma série de demandas às instituições financeiras, que se adotadas voluntariamente pelos bancos, podem prevenir que financiamentos como os de Claudecy ocorram. 

Dentre as demandas está que os bancos devem verificar antes da concessão do crédito e periodicamente o cumprimento dos critérios socioambientais e se, constatado descumprimento, suspender a concessão e/ou liquidar antecipadamente a operação; Vedar a concessão de crédito para imóveis rurais que tenham usado fogo de maneira ilegal e solicitar a rastreabilidade da pecuária e apresenação da Autorização para Supressão de Vegetação (ASV) caso haja desmatamento após julho de 2008.

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