Garimpeiros usam o fogo para abrir novas áreas de exploração irregular
O fogo avança sobre o território sagrado dos Kayapó. O cenário é de muita fumaça e destruição. A Terra Indígena Kayapó (PA), historicamente impactada pelo garimpo ilegal, lidera o triste ranking das terras mais afetadas por incêndios florestais em 2024 no Brasil, com 3.246 focos de calor registrados desde o início do ano até o dia 24 de setembro. Por ali, a situação é dramática, pois tudo indica que o fogo é causado por garimpeiros que estão abrindo novas áreas para continuar explorando ouro ilegalmente.
De acordo com o Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LASA/UFRJ), uma área de 697.475 hectares já foi queimada dentro da Terra Indígena Kayapó – o equivalente a 21,24% de todo o território. Este é o pior resultado de toda a série histórica, que teve início em 2012. A situação é mais grave quando lembramos que a Terra Indígena não possui brigada de combate ao incêndio, devido à insegurança de se estar no território.
Profissionais do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) contam que os incêndios dentro da Terra Indígena Kayapó foram causados por garimpeiros, que estão abrindo novas áreas para exploração. Essa teoria se confirma quando se analisa imagens de satélite, que mostram claramente que as áreas em que os focos de calor se concentram estão sobrepostas ou muito próximas a áreas de garimpo abertas recentemente.
Setembro em chamas
A situação no território Kayapó era relativamente estável até o início de agosto, quando começaram a aparecer, com mais volume e frequência, os focos de calor. As formações de savana e áreas de não-floresta foram as mais atingidas. A primeira quinzena de setembro, no entanto, foi de muitas chamas e destruição – dos 2.937 focos de calor acumulados em 2024 naquela região, 1.799 (nada menos que 61%) foram registrados nesse curto período.
O pico de incêndios foi registrado em 4 de setembro, quando foram registrados 354 focos de calor. Em seguida, a Operação Xapiri Tuire, conduzida por órgãos como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), o Ibama e a Polícia Rodoviária Federal (PRF) fez com que os focos diminuíssem. Mas no dia seguinte ao final da operação, em 11 de setembro, outro pico aconteceu, com 260 focos de calor.
Essa data guarda um triste marco da temporada 2024 – de cada 5 focos de calor registrados em toda a Amazônia neste dia, 1 deles ocorreu em Terras Indígenas. Foram 2.512 focos verificados na Amazônia, e 511 apenas dentro dos territórios originários.
Ações emergenciais
O cacique Megaron Txucarramãe, importante liderança do povo Kayapó, sobrevoou as Terras Indígenas Capoto-Jarina (MT) e Kayapó junto à equipe do Greenpeace Brasil. Ele testemunhou uma realidade devastadora: a floresta em chamas, a vida sendo consumida pelas labaredas e a destruição do que é ancestral e essencial para seu povo.
“Vamos levar 30 anos para esse mato crescer e voltar ao normal. Mas, do jeito que tá queimando todo ano, daqui a pouco vai ter só capoeira. Desde o início eu venho pedindo apoio ao governo, pedindo pra ver se eles mandam aviões para apagar o fogo, mas até agora não deram resposta. Veio o IBAMA e o PrevFogo, mas não conseguem controlar o fogo, que começou sem a gente esperar. A gente usa o fogo, mas tem dia, tem hora, tem mês certo para queimar roça. Esse ano aconteceu de repente, esse incêndio não é normal. Animais tão queimando, aldeias já queimaram, muita coisa tá sendo destruída pelo fogo”, contou o cacique.
As lideranças indígenas clamam por ação, e o Greenpeace Brasil reforça essa urgência. Jorge Eduardo Dantas, porta-voz da Frente de Povos Indígenas do Greenpeace Brasil, destaca: “O Greenpeace percebe que a estrutura de combate a incêndios florestais no Brasil hoje é insuficiente. Ela não consegue atender à demanda e à gravidade do problema. Precisamos, por exemplo, de brigadas aéreas preparadas para atuar nos mais diversos territórios. Estamos em um cenário de mudanças climáticas, onde os eventos extremos vão se tornar mais intensos e frequentes. Precisamos mudar a forma como encaramos esse problema.”
Problema antigo
O garimpo é um problema antigo do território Kayapó. Levantamento divulgado pelo Greenpeace em julho mostrou que praticamente metade da abertura de novas áreas de garimpo feita dentro de Terras Indígenas na Amazônia no primeiro semestre de 2024 ocorreu por ali. Foram 227 hectares devastados pela atividade garimpeira. O levantamento considerou as Terras Kayapó, Munduruku e Yanomami, que reúnem mais de 90% da ocorrência de garimpos ilegais dentro de territórios originários no bioma. Em 2023, foram 1.109 hectares destruídos dentro daquela área por conta da exploração ilegal de ouro.
No relatório “Parem As Máquinas!”, lançado em abril de 2023, das 176 ocorrências de escavadeiras hidráulicas mapeadas pelo Greenpeace – e que estavam sendo empregadas no garimpo – nada menos que 140 (79%) estavam no território Kayapó.
Até o meio do ano, o garimpo já ocupava 15.715 hectares dentro da Terra Indígena Kayapó. No entanto, o sistema de monitoramento do Greenpeace, o Papa Alpha, detectou mais 190 hectares de desmatamento associado ao garimpo no mês de julho. Dentro dos territórios originários, o garimpo causa prejuízos ambientais (como a morte dos rios, erosão do solo, destruição de habitats), a desestruturação de comunidades (com aliciamentos, violências sexuais, transmissão de doenças); geralmente está ligado a outros crimes como tráfico de drogas e sonegação fiscal e não causa desenvolvimento – os dividendos que ficam para os estados e municípios são muito baixos e não compensam seus prejuízos.
Retirada dos garimpeiros
As chamas avançam, e a resposta do governo e da sociedade precisa ser rápida e contundente. A proteção das Terras Indígenas e da Amazônia é uma questão urgente que vai além da defesa ambiental — é a conservação da vida e da cultura de povos que protegem essa floresta há milênios.
Apoie o Greenpeace Brasil nesta luta. Assine a nossa petição “Amazônia Livre de Garimpo” e nos ajude a cobrar das autoridades brasileiras a retirada dos garimpeiros das Terras Indígenas em toda a Amazônia.
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