Legislação dificulta os processos demarcatórios das Terras Indígenas e fragiliza o trabalho de órgãos ligados à pauta

Povos Indígenas de todo o país se mobilizaram em Brasília para acompanhar o julgamento do STF que tornou o Marco Temporal inconstitucional, em 2023. Crédito: © Pedro Ladeira / Greenpeace

Promulgada no final de 2023, no apagar das luzes do ano legislativo, a Lei 14.701/2023, atualmente em vigor, representa uma das maiores ameaças aos direitos indígenas que existem hoje em nosso país. Ela não só restabeleceu o Marco Temporal em nosso ordenamento jurídico como trouxe novos critérios para a demarcação de Terras Indígenas, dificultando o acesso dos povos originários a seus direitos e territórios. Por isso, em nome do futuro do nosso país e da vida dos povos indígenas, é fundamental que essa Lei seja derrubada o quanto antes.  

Vale aqui fazer um histórico: promulgada em 28 de dezembro do ano passado, a Lei 14.701 foi uma resposta do Congresso Nacional à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que declarou a inconstitucionalidade do Marco Temporal. Ela é, na prática, mais uma das várias ferramentas que o agronegócio utiliza para invadir e saquear os territórios indígenas, colocando a exploração predatória dos recursos naturais à frente da manutenção da vida e dos interesses da coletividade. 

Não à toa, assim que ela foi promulgada, a maior organização indígena do país, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com os partidos Socialismo e Liberdade (PSOL) e Rede Sustentabilidade, pediram que ela fosse declarada inconstitucional. Hoje, este pedido está com o Ministro Gilmar Mendes, que conduz uma mesa de negociação sobre o Marco Temporal e ainda não se manifestou sobre o pedido da Apib.  

Situações de violência

O efeito da 14.701 foi imediato – ela não só dificultou os processos demarcatórios das Terras Indígenas que estavam em curso, como fragilizou o trabalho de órgãos ligados à pauta indígena, como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Ela possibilita, por conta dos novos critérios que trouxe, o despejo de comunidades Brasil afora e abre brechas para a anulação de demarcações feitas em anos anteriores. 

Uma de suas consequências mais perversas, no entanto, é a manutenção do clima de terror em que vivem alguns povos, já que conflitos foram acirrados e situações de violência foram intensificadas. Recentemente, comunidades Guarani do Mato Grosso do Sul e do Oeste do Paraná viveram uma escalada de violência: em 18 de setembro, Neri da Silva, de 22 anos, foi assassinado com um tiro na cabeça durante um ataque da Polícia Militar contra uma comunidade que fica dentro da Terra Indígena Ñanderu Marangatu, em Antônio João (MS).

Para o coordenador jurídico da Apib, Maurício Terena, a suspensão da Lei 14.701 é uma prioridade para que se estabeleçam critérios justos durante o processo de conciliação do Marco Temporal, que ocorre no STF desde agosto. A Apib se retirou da mesa de negociações por entender que as regras estabelecidas desfavorecem os povos indígenas e ameaçam sua dignidade.

“A Apib é uma das autoras de uma ação que questiona a constitucionalidade da Lei 14.701, e desde o dia 1º de agosto aguardamos que o ministro Gilmar Mendes acolha o nosso pedido de tramitação. No entanto, até o momento, ele não respondeu ao nosso pedido. Todas as manifestações dos povos indígenas dentro deste processo têm sido ignoradas. É fundamental que a sociedade brasileira saiba que sempre estivemos abertos ao diálogo, buscando a Suprema Corte para garantir condições de participação igualitária nessa conversa. Os povos indígenas são uma população vulnerável, sem representação política adequada, e é imprescindível que o Judiciário brasileiro, a partir deste caso, repense a forma como faz justiça”,  afirmou Terena, em entrevista coletiva recente.

Terras Indígenas contra as mudanças climáticas

Estudos do WRI Brasil, indicam que as terras indígenas são fundamentais no sequestro de carbono da atmosfera, além de desempenharem papel decisivo no combate ao desmatamento. No contexto de crise climática global que já estamos vivendo, essas áreas agem como barreiras naturais contra a degradação ambiental, ajudando a preservar ecossistemas inteiros e regulando o clima – além de possibilitar que os povos originários vivam conforme seus costumes e tradições.

Para Jorge Eduardo Dantas, porta-voz da Frente de Povos Indígenas do Greenpeace Brasil, o objetivo da Lei 14.701 é muito claro: “Essa lei existe porque há um grupo grande e poderoso no Congresso Nacional quer impedir a demarcação das Terras Indígenas e quer abrir os territórios que já existem para a exploração econômica. Fazendeiros, garimpeiros e grandes mineradoras nunca deixaram de cobiçar os territórios originários. A Lei 14.701 é mais um ataque aos direitos dos povos indígenas e mais uma mostra de como o agronegócio pensa primeiro em seus interesses econômicos e só depois na conservação dos recursos naturais e na sobrevivência dos povos indígenas de todo o País”.  

O porta-voz lembrou também que a defesa das Terras Indígenas é uma pauta que deve envolver toda a sociedade. “Ao proteger essas áreas, os povos indígenas estão na linha de frente da luta contra a crise climática, preservando as florestas que sequestram carbono e evitando emissões massivas de gases de efeito estufa. A destruição desses territórios ameaça não só a vida das comunidades que os habitam, mas também o equilíbrio ambiental que depende delas”, afirmou.

Proteção é essencial

Ignorar a importância das Terras Indígenas é acelerar a degradação ambiental com consequências devastadoras para o clima global. A crise de seca severa, marcada por recordes de queimadas, poluição do ar e uma escassez de água histórica nos rios da Amazônia, é um exemplo claro das consequências de negligenciar esses territórios. A proteção dessas áreas é essencial para a manutenção de ecossistemas que regulam o clima.

A luta contra a Lei 14.701 e o Marco Temporal é, antes de tudo, uma luta pela justiça social, pela defesa dos direitos dos povos indígenas e pela conservação do meio ambiente. Essa causa não é exclusiva dos povos indígenas, mas de todos que acreditam em um futuro sustentável, justo e possível.

Por isso, convidamos você a se juntar a nós nessa luta. Assine a petição Marco Temporal Não! e nos ajude a alcançar a meta de 100 mil assinaturas, que serão entregues ao Supremo Tribunal Federal para pressionar pela derrubada da Lei 14.701 e pela proteção dos direitos indígenas.

Cada assinatura é um passo em direção à justiça e à garantia de um futuro possível para todas e todos. Faça a diferença agora!

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