A incidência de fogo no Pantanal este ano promete ser mais cruel e duradoura, ameaçando a sobrevivência da rica biodiversidade do bioma

Em 2020, incêndios de grandes proporções consumiram mais de 20% do Pantanal. (© Leandro Cagiano/ Greenpeace)

O Pantanal, a maior planície interior úmida do planeta, está em chamas e o fogo ameaça a sobrevivência da biodiversidade e a saúde humana! Historicamente, é esperado o aumento das queimadas no bioma entre os meses de julho e outubro devido a diminuição das chuvas e vazantes dos rios, mas esse ano, o fogo já bateu recordes um mês antes de começar “oficialmente” a estação mais seca. A situação é crítica, preocupante e exige um trabalho integrado entre o governo federal e os governos estaduais. 

O Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LASA/UFRJ) divulgou recentemente uma nota técnica sobre a evolução das áreas afetadas pelo fogo e das condições climáticas do Pantanal. Os dados do sistema ALARMES (alertas em tempo quase-real) mostram que no período de 01 de janeiro a 23 de junho de 2024, as áreas afetadas pelo fogo em comparação aos anos anteriores tiveram um aumento significativo, considerado até agora um dos mais severos das últimas décadas. Nesse período, o fogo no bioma consumiu 627 mil hectares de vegetação, o equivalente a mais de 800 mil campos de futebol, ultrapassando os dados de 2020 para o mesmo período, que foram de 258 mil hectares de vegetação. 

“Vários fatores contribuem para este aumento: a região está mais seca, o que está intimamente relacionado às mudanças climáticas, já que parte da água do bioma vem da região Norte do país e também é produzida pela floresta. Entretanto, em maio deste ano completaram-se 12 meses consecutivos de recordes de altas temperaturas no país, o que contribuiu para a diminuição da chuva, deixando a vegetação do bioma mais seca. Esse cenário é mais favorável ao fogo”, afirma o porta-voz do Greenpeace Brasil, Rômulo Batista, sobre o aumento das queimadas no Pantanal. 

Mudanças climáticas e seus efeitos no Pantanal

De acordo com o SPEI Global Drought Monitor (Monitor Global de Secas SPEI), a região do Pantanal está sob regime de seca persistente de intensidade extrema a moderada pelo menos nos últimos 12 meses. O ressecamento do solo observado pelo biênio 2023/2024 é sem precedentes em termos de intensidade e duração do tempo da seca, segundo o LASA/UFRJ. 

O ano de 2024 até o momento é um dos mais secos da história, conforme apontou o Boletim de Monitoramento Hidrológico de 20 de junho de 2024, divulgado pelo Serviço Geológico do Brasil (SGB). A falta de chuvas impacta diretamente os rios da região e seus pulsos de inundação, que é o “ir e vir” das águas do Pantanal, ou seja, a enchente e a seca. Esse é um processo natural e essencial para a garantia da vida e diversidade de todo o bioma. 

Outros dados preocupantes apontados pela nota técnica do LASA/UFRJ dizem respeito ao resultado das altas temperaturas em conjunto com a seca extrema. A soma desses fatores favoreceram o elevado acúmulo de material combustível, que é justamente a vegetação gramínea, rasteira e mais seca, que alimenta as linhas de fogo. A nota diz ainda que a Bacia do Rio Paraguai, que abrange a região do Pantanal, “enfrenta um déficit significativo de chuvas desde o início do período chuvoso em outubro de 2023”, sendo assim, “todos os rios da região apresentaram em junho de 2024 níveis abaixo do normal para esta época do ano, com exceção do rio Cuiabá na estação de Cuiabá, que mantém seus níveis dentro das expectativas”. 

As mudanças climáticas e a ação humana têm provocado outros cenários preocupantes. Segundo um recente levantamento publicado pelo MapBiomas Águas, o Pantanal foi o bioma que mais secou ao longo da série histórica que cobre o período entre 1985 e 2023. Em 2023, a maior planície interior úmida do planeta teve sua superfície de água anual de 382 mil hectares, ou seja, 61% abaixo da série histórica. Apenas 2,6% do bioma estava coberto por água. A rede também apontou que houve redução da área alagada e do tempo de permanência da água. 

Previsão dos próximos meses.

Os próximos meses não são animadores, a expectativa é que as temperaturas se mantenham acima da média e a precipitação continue abaixo do normal para o próximo trimestre – julho a setembro. O solo contendo turfa, tipo de material orgânico resultante da decomposição da vegetação que se acumula no solo e pode alcançar vários metros de profundidade, atingiu um nível de ressecamento sem precedentes em 2023/2024 em termos de intensidade e duração, funcionando como combustível adicional nessa fórmula. “A probabilidade da área queimada exceder 2 milhões de hectares até o final de 2024 é superior a 80%”, ressaltou ainda a nota técnica do LASA/UFRJ. 

Outras consequências.

O fogo no Pantanal traz consigo outras consequências significativas quando falamos da saúde da população. Estima-se que a qualidade do ar está muito deteriorada, porém não há medições devido à escassez de dados de estações de qualidade do ar, segundo a nota.

A origem dos incêndios de 2024.

O Pantanal hoje enfrenta diversas situações conforme relatamos acima: reflexo da redução das chuvas, aumento da temperatura e seca que já dura mais de 12 meses, solo contendo material combustível para novos focos de calor e rios que não atingiram a cota de inundação. O bioma se tornou uma espécie de tocha gigante, pronta para ser queimada!

Combine a isso o avanço do agronegócio sobre o Pantanal, e temos hoje um cenário ainda mais grave que o de 2020, quando o bioma teve mais de 16 milhões de animais mortos e cerca de 39 mil Km² queimados. Em 2024, o fogo chegou mais cedo, isso se deve às mudanças climáticas. 

Mas apesar do clima favorável aos incêndios, o fogo não começa sozinho, ele comumente se inicia em alguma fazenda, quando a queima de uma pastagem ou desmatamento sai do controle. Na avaliação do LASA/UFRJ, foi demonstrado que a grande maioria, senão todos os focos de calor registrados no ano, teve o ser humano como seu iniciador. Por exemplo, em junho, só foi registrado um raio no território do Pantanal e mesmo assim na região norte do Bioma, que não está passando por queimadas. Além disso, o desmatamento no bioma segue em patamares altíssimos desde 2020.

Onde há fogo, há alguém que lucra, enquanto a sociedade e a biodiversidade pagam a conta.

Um convite para agir pela proteção do Pantanal!

Um levantamento realizado pelo Greenpeace Brasil, com base em dados públicos realizado, revela que o Banco do Brasil concedeu mais de R$10 milhões em crédito rural ao fazendeiro Claudecy Oliveira Lemes, dono de 11 fazendas no Pantanal. Claudecy é acusado de utilizar ilegalmente em suas fazendas no Pantanal agrotóxicos desfolhantes (como a substância 2,4-D, utilizado na Guerra do Vietnã) para a prática de desmatamento químico de vegetação nativa. A investigação também revelou que o fazendeiro forneceu gado para a JBS entre 2020 e 2023.

O Banco do brasil é um dos bancos mencionados no relatório “Bancando a Extinção: bancos e investidores como sócios no desmatamento”, onde o Greenpeace Brasil denuncia como a falta de controle adequado dos bancos na concessão de crédito rural beneficia produtores rurais envolvidos com desmatamento, grilagem e demais irregularidades socioambientais e cobra que o sistema financeiro estabeleça, entre outras ações, o monitoramento contínuo das áreas financiadas.

Ativistas protestam contra o financiamento do desmatamento em Brasília | Foto: © Tuane Fernandes / Greenpeace

Quem banca essas atividades também é responsável pelo problema. Nós precisamos de mudanças urgentes no sistema financeiro. Nos ajude a pressionar os bancos para que cumpram as regras atuais na concessão de crédito rural e implementem medidas mais rigorosas para interromper imediatamente o direcionamento de recursos para quem desmata e causa danos à biodiversidade, ao clima, aos povos tradicionais e ao nosso futuro.

Sem grana para a destruição! Assine o abaixo-assinado “Bancando a extinção!”

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