Greenpeace Brasil revisitou as 478 propriedades onde foram identificados focos de fogo durante os dias 10 e 11 de agosto de 2019.

Localizada em Altamira (PA), a fazenda Bacuri apresentou focos de calor entre os dias 10 e 29 de agosto de 2019.
© Christian Braga / Greenpeace

Era agosto de 2019 e a Amazônia enfrentava um número recorde de queimadas. O Brasil e o mundo estavam prestes a testemunhar, no estado do Pará, um evento supostamente organizado por fazendeiros locais e proprietários de terra que ficou conhecido como o “Dia do Fogo”. A ação criminosa contou com um grande número intencional de queimadas na região, em meio à um contexto, na época, de enfraquecimento da gestão ambiental no país.

As autoridades brasileiras buscaram a identificação dos supostos responsáveis por esses incêndios criminosos, mas as investigações não resultaram em prisões até hoje. Em 2020, o Greenpeace Brasil elaborou o estudo de caso “O Dia do Fogo: Um ano depois!” trazendo um levantamento sobre áreas de cadastros ambientais rurais e áreas embargadas envolvidas no evento.

Ao longo desses anos, um sentimento pairou em todos nós de que existe uma carta branca da impunidade para os supostos responsáveis por essa mobilização. No documento “Dia do Fogo: Cinco anos mais tarde!”, o Greenpeace Brasil revisitou as 478 propriedades onde foram identificados focos de fogo durante os dias 10 e 11 de agosto de 2019 e constatou que essas fazendas seguem com altos índices de desmatamento e queimadas recorrentes, além de algumas delas terem obtido recursos do crédito rural, instrumento da política agrícola brasileira.

Alguns fatos que merecem nossa atenção

Nos 478 imóveis analisados:

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65,2% dos imóveis foram embargados por diversas infrações, mas apenas 10,47% por uso ilegal do fogo, o que demonstra uma subnotificação neste caso. Também, foram identificadas 662 multas que totalizam R$ 1.277.113.955,90, onde apenas R$ 41.380,00 foram pagas, denotando a impunidade que perpassa esses crimes ambientais.

Foram registrados 206.083 mil hectares de desmatamento entre os anos de 2008 e 2023 da série histórica de desmatamento do PRODES, sendo que o ápice do desmatamento foi justamente o ano de 2019. Os 478 imóveis analisados queimaram e continuaram registrando focos de calor e cicatrizes de área queimada ao longo dos últimos anos.

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Cicatrizes de fogo em imóveis rurais analisados

Houve uma rápida expansão da agropecuária entre 2018-2022. A área de pastagem cresceu 30,8% enquanto a de agricultura quase 55%. 

Existem 106.594 mil hectares sobrepostos a áreas de Florestas Públicas Não Destinadas (FPND), que são aquelas pertencentes à União ou aos estados, mas ainda não destinadas para conservação ou uso sustentável. A sobreposição entre os Cadastros Ambientais Rurais (CAR) dessas propriedades e FPND é um primeiro indício de grilagem de terras. Nessas áreas de FPND, entre agosto de 2018 e julho de 2023 uma extensão maior que a área urbanizada de Belém-PA foi desmatada.

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Propriedade relacionada ao Dia do Fogo: Floresta Pública Não Destinada com desmatamento e fogo. Fonte: Elaborado por Greenpeace Brasil (2024) com base nas informações de Planet (2022); SICAR (2020); SFB (2022).
Propriedade relacionada ao Dia do Fogo: Floresta Pública Não Destinada com desmatamento e fogo. Fonte: Elaborado por Greenpeace Brasil (2024) com base nas informações de Planet (2022); SICAR (2020); SFB (2022).

29 propriedades acessaram recursos do crédito rural, totalizando 127 transações e um montante de R$ 201.418.002,16. A maior parte dessas operações, 74%, tiveram a finalidade de aquisição, criação e manutenção de bovinos, uma soma de R$ 134.473.688,80. Isso sinaliza a necessidade de maior controle na concessão de crédito para a atividade pecuária.

Bancos podem estar emprestando o seu dinheiro para financiar atividades que desmatam e queimam a Amazônia. As instituições financeiras também são parte do problema! Elas precisam aumentar o rigor das regras na concessão de crédito e estabelecer o monitoramento contínuo das áreas financiadas para garantir que os recursos não estejam contribuindo para o dano ambiental.

É injusto que proprietários que desmataram e queimaram enormes áreas, inclusive florestas públicas, tenham acessado recursos do crédito rural, que conta com o nosso dinheiro, enquanto, em alguns casos, devem grandes montantes em multas ambientais. É necessário que os bancos neguem crédito para o agronegócio que fez uso do fogo de maneira criminosa, como o visto do Dia do Fogo”, comenta Thais Bannwart, porta-voz de Florestas do Greenpeace Brasil.

No relatório Bancando a Extinção, o Greenpeace apresentou uma série de demandas às instituições financeiras, incluindo o Banco do Brasil, e a situação acima reforça a importância da rápida adoção das demandas, com destaque para: 

  • Os bancos devem verificar antes da concessão do crédito e periodicamente o cumprimento dos critérios socioambientais e se, constatado descumprimento, suspender a concessão e/ou liquidar antecipadamente a operação;
  • Vedar a concessão de crédito para imóveis rurais que tenham usado fogo de maneira ilegal e solicitar a rastreabilidade da pecuária e apresentação da Autorização para Supressão de Vegetação (ASV) caso haja desmatamento após julho de 2008.

Ao completar cinco anos do Dia do Fogo dentro de um legado de impunidade, é importante que a sociedade civil se mobilize para deixar o seu recado:

Fogo criminoso com nosso dinheiro, não!

Assine a petição e participe da campanha Bancando a Extinção que exige que os bancos parem de financiar desmatadores.

SPOILER: em breve iremos falar mais sobre o caso do fazendeiro que recebeu um financiamento de quase um milhão de reais mesmo após ter sido multado pelo IBAMA por infração à flora.

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