Apesar da NDC garantir que Brasil cumpra o Acordo de Paris, o desejado seria país atingir emissões negativas em 2045.

Global Climate Strike in São Paulo, Brazil. © Victor Bravo / Greenpeace
Greve Global pelo Clima em São Paulo, Brasil, na edição de 2021. © Victor Bravo / Greenpeace

O governo Lula anunciou nesta quarta-feira (20), durante a semana do Clima da ONU, em Nova Iorque, a correção da meta climática brasileira no Acordo de Paris, retomando o estabelecido em 2015. O compromisso do Brasil com o Acordo havia sido reduzido no governo Bolsonaro, permitindo que o país chegasse em 2030 emitindo 400 milhões de toneladas de gases do efeito estufa a mais do que o previsto na meta original. O caso ficou conhecido como “pedalada climática”.

O anúncio foi realizado pela ministra do Meio Ambiente Marina Silva, que confirmou o esperado: o governo corrigiu a “pedalada climática” da gestão anterior, e retornou ao compromisso assumido em 2015.

Chamada de Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês), a NDC é um compromisso em que cada país do Acordo de Paris (relembra o Acordo abaixo) sinaliza para a comunidade internacional o quanto deverá emitir em gases de efeito estufa até o final da década. O objetivo é que, juntos, os países consigam limitar em 1,5ºC o aquecimento do planeta até o final do século 21. 

Corrigir a NDC brasileira para o que foi estabelecido em 2015 é um passo certo, uma vez que recoloca o país no caminho para se tornar carbono zero em 2050 – premissa do Acordo de Paris.

Porém, atualmente, oito anos após o Acordo de Paris e com a mudança do clima se mostrando pior e mais severa do que o que fora projetado em 2015, é preciso que o Brasil se comprometa com mais ambição na meta de frear o aquecimento global, e se torne carbono zero antes da metade do século. E isso é possível.

Considerando sua matriz energética de baixa emissão de carbono e as oportunidades para uma transformação ecológica eficaz, o Brasil tem condições de se tornar a primeira grande economia do mundo a sequestrar mais gases com efeito de estufa do que emitir. Para isso, no entanto, é  importante que inconsistências na agenda verde do governo sejam sanadas, como as disputas por abrir novas áreas para exploração de petróleo.

“O Greenpeace Brasil elogia o governo brasileiro pela decisão de revisar sua NDC, ressaltando as inúmeras medidas proativas tomadas pela nova administração em resposta à emergência climática. No entanto, embora acabar com o desmatamento seja um passo crucial para enfrentar esse desafio, o Brasil deve ir além. Um compromisso genuíno com o combate à crise climática não pode coexistir com políticas que incentivem novas explorações de petróleo, especialmente em áreas ambientalmente sensíveis como a foz do Rio Amazonas”, afirma Carolina Pasquali, Diretora Executiva do Greenpeace Brasil.

Casa atingida por enchente e carro inundado por água e lama
Petrópolis (RJ) em fevereiro de 2022, quando as fortes chuvas causaram deslizamentos e tiraram a Gvida de mais de cem pessoas, desabrigando milhares (Foto: Thomas Mendel/Greenpeace)

Outra inconsistência que precisa ser resolvida no governo atual para diminuirmos as emissões brasileiras diz respeito às usinas de geração de energia a partir de carvão, super poluidoras da atmosfera.

“O Brasil segue operando usinas a carvão, que já não são necessárias para a segurança energética nacional. Além disso, quando olhamos para a matriz energética como um todo, e não só elétrica, nos preocupa a falta de perspectiva para uma efetiva transição ecológica, que preveja a substituição gradual dos combustíveis fósseis, como o petróleo. Pior: o governo segue defendendo o avanço da indústria petrolífera em áreas extremamente sensíveis e fundamentais para o futuro do país, como a bacia da Foz do Amazonas”, diz Marcelo Laterman, porta-voz de Oceanos do Greenpeace Brasil.

Falta ambição: Brasil tem condições de zerar carbono até 2045

Nas eleições presidenciais de 2022, o Greenpeace Brasil, juntamente com outras organizações brasileiras que integram o Observatório do Clima, apresentou um documento aos candidatos descrevendo ações que o próximo governo deveria implementar para tornar o país negativo em carbono até 2045. O estudo demonstra que a meta é possível e que o Brasil tem potencial para se tornar a primeira grande economia do mundo a sequestrar mais gases com efeito de estufa do que emitir.

A rápida queda na taxa de desmatamento na Amazônia brasileira nos primeiros 8 meses de 2023 (em comparação com o mesmo período do ano passado) sinaliza que um combate eficaz à degradação florestal pode contribuir para alcançar a ambiciosa meta de reduzir as emissões em 50% até 2030, mas precisamos de medidas mais concretas e de objetivos claros que vão além da eliminação do desmatamento na Amazônia, como:

  • Eliminar o desmatamento em todos os biomas brasileiros até 2030;
  • Garantir uma Amazônia livre de garimpo, incluindo a desintrusão imediata das terras indígenas mais impactadas na Amazônia brasileira; 
  • Reconhecimento e demarcação de todos os territórios ocupados pelos povos e comunidades tradicionais, além da demarcação de novas Unidades de Conservação; 
  • Recuperar e reflorestar pastagens degradadas e desmatadas, com especial atenção para regiões estratégicas para a manutenção sustentável da floresta, dos rios, lençóis freáticos e da biodiversidade.
  • Não expandir novas fronteiras de exploração de petróleo para a Amazônia ou outras regiões sensíveis;
  • Promover uma transição energética justa e ecológica, que considere os aspectos geográficos e sociais do Brasil;
  • Questionar acordos de associação e comércio que colocam ainda mais pressão nas florestas e reforçam a posição do Brasil como exportador de commodities. ;
  • Criar e fortalecer políticas que estimulem a agroecologia e garantam a soberania e a segurança alimentar dos povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais e população do campo

Acordo de Paris em 3 pontos

1-Manter o aumento da temperatura média global idealmente abaixo de 1,5 ºC

O mundo se comprometeu a limitar o aumento da temperatura global a  2 ºC em relação aos níveis da era pré-industrial e a “continuar os esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5 ºC” até o final deste século. 

No entanto, já estamos observando efeitos catastróficos de um aquecimento com apenas 1.1ºC a mais na temperatura global. Isso reflete a urgência em se reduzir as emissões dos gases causadores do efeito estufa, que no Brasil são principalmente provenientes do desmatamento e queimadas, mudanças no uso da terra e transportes.

2-Ajuda financeira aos países em desenvolvimento

Em 2009 prometeu-se que os países desenvolvidos disponibilizariam 100 bilhões de dólares por ano, a partir de 2020, para ajudar as nações em desenvolvimento a financiar a transição para energias limpas, assim como sua adaptação aos efeitos do aquecimento. 

Além dessa ajuda anual não estar sendo cumprida em sua totalidade – os fluxos financeiros internacionais de adaptação aos países em desenvolvimento estão 5 a 10 vezes abaixo das necessidades estimadas, segundo um relatório da ONU do ano passado, – as necessidades anuais de adaptação estimadas no passado já estão superiores aos 100 bilhões de dólares anuais. 

3-Transparência e divulgação dos dados climáticos

Os países signatários do Acordo de Paris devem registrar e divulgar suas atividades para proteção do clima, assim como dados sobre a emissão de gases de efeito estufa. Por isso, é importante que os países tenham condições de medir regularmente suas emissões e estejam dispostos a compartilhar os dados. Apesar disso, o Acordo de Paris não prevê nenhuma sanção a países que não cumprem as estipulações.

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