Brasil, meu nego
Deixa eu te contar
A história que a história não conta
O avesso do mesmo lugar
Na luta é que a gente se encontra

Brasil, meu dengo
A Mangueira chegou
Com versos que o livro apagou
Desde 1500
Tem mais invasão do que descobrimento
Tem sangue retinto pisado
Atrás do herói emoldurado
Mulheres, tamoios, mulatos
Eu quero um país que não está no retrato

Estação Primeira de Mangueira – História para Ninar Gente Grande

Nesta segunda-feira, dia 20 de novembro, foi o Dia Nacional da Consciência Negra. Dia da morte de Zumbi dos Palmares, um dos líderes do Quilombo dos Palmares e maior referência da luta do povo negro brasileiro por liberdade. Luta que continua flamejante naqueles e naquelas que lutam pela igualdade de direitos e pelo combate incessante às desigualdades no país. Faz-se necessário negritar que as desigualdades sociais latentes e pungentes no Brasil são, antes de tudo, desigualdades raciais, fruto de um doloroso processo de exploração, violência e genocídio. Apenas o Brasil recebeu cerca de 4,9 milhões de africanos escravizados, sem contar aqueles que morreram no caminho e que fazem do Oceano Atlântico o maior cemitério do mundo. Essas informações são do Banco de Dados do Tráfico de Escravos Transatlântico. Para efeito comparativo, os EUA receberam 389 mil negros africanos escravizados e o Brasil foi o último país a abolir a escravidão. 

Infelizmente, nossa história é construída a partir destes lugares. A história de 56% da população brasileira, que é composta por pessoas negras (pretas e pardas), mas também a história do país.

“Eu classifico São Paulo assim: O Palácio é a sala de visita. A Prefeitura é a sala de jantar e a cidade é o jardim. E a favela é o quintal onde jogam os lixos.”

Carolina Maria de Jesus


As formas de vida e as configurações socioespaciais se transformaram a partir das desigualdades, e são essas desigualdades que delimitam e zoneiam os espaços urbanos, que criam abismos dentro de um mesmo plano diretor e o que separam as áreas nobres, saneadas, urbanizadas das periferias, dos aglomerados sub-humanos, da exposição ao risco da falta de moradia, saúde e que conta com a presença constante do braço armado do Estado. O 14 de maio de 1888, dia seguinte à abolição, criou formalmente sem tetos, sem terras e desempregados. O Estado Brasileiro decidiu indenizar aqueles e aquelas que construíram riquezas a partir da exploração e da mão de obra escravizada de negros e negras. E as pessoas que agora eram ex-escravizadas mas que ficaram sem qualquer garantia? Marginalizados e sem acesso, até hoje, ao mínimo, ao básico e ao fundamental.

Lutar por Justiça Climática é lutar pelo fim das desigualdades, pela garantia do direito constitucional à vida e ao bem-viver. Mas é entender que isso se dá a partir da luta por justiça racial e pelo combate ao racismo ambiental, justamente por entender que um lugar bom, digno, seguro e justo para as pessoas negras é um território bom não só para a maioria da população, mas é um lugar bom para todas, todos e todes. 

Não é possível desejar um mundo melhor para todas as pessoas sem pensar que é preciso garantir o direito à moradia, à educação, à segurança integral, à mobilidade urbana, ao trabalho e renda, à saúde, o direito à cultura, ao lazer, e ao meio ambiente.

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

Constituição Federal

Zumbi, Dandara, Aqualtune, Ganga Zumba e tantos outros negros e negras que construíram Palmares já viviam, à epoca, um futuro alternativo, de proteção, acolhimento, cuidado e segurança para aqueles que sofreram todo tipo de violência. Os quilombos e os terreiros até hoje são um espaço de proteção e pertencimento a partir da conexão e luta pelo território. Plantar, colher, cuidar, e coletivizar a vida. Assim como os povos indígenas, o povo negro detém tecnologias sociais para enfrentar a crise climática. Pessoas que nasceram, cresceram e que querem permanecer no seu território são as melhores pessoas para encontrarem soluções e caminhos para uma adaptação às mudanças climáticas. E é nessa perspectiva que esperamos seguir: coletivizando e fortalecendo as lutas daqueles e daquelas que vieram antes de nós e que já fazem a defesa de seus territórios e da vida do seu povo.  

Seguiremos os caminhos da luta de Carmem Silva, Sarah Marques, Mônica Oliveira, Sueli Carneiro, Neneide Lima, Givânia Maria da Silva, Mãe Meninazinha de Oxum, Jurema Werneck, Nilma Bentes, Inaldete Pinheiro, Joice Paixão, Luiza Cavalcante, Bianca Santana, Nilma Lino Gomes, Zélia Amador de Deus e tantas outras mulheres negras vivas que honram o legado de Tereza de Benguela, Luiza Mahin, Antonieta de Barros, Lélia Gonzalez, Beatriz Nascimento, Carolina Maria de Jesus, Elza Soares, Marielle Franco e Mãe Bernadete Pacífico. É por todas elas e por nós.

Sem a ajuda de pessoas como você, nosso trabalho não seria possível. O Greenpeace Brasil é uma organização independente - não aceitamos recursos de empresas, governos ou partidos políticos. Por favor, faça uma doação hoje mesmo e nos ajude a ampliar nosso trabalho de pesquisa, monitoramento e denúncia de crimes ambientais. Clique abaixo e faça a diferença!