Na última semana, o Greenpeace Brasil doou mais de 10 toneladas de alimentos aos atingidos pelas alagações

Em 2021, o rio Negro chegou à marca de 30,02 metros – o maior índice dos últimos 119 anos

A capital do Amazonas, Manaus, vivencia este ano a maior cheia desde o início das medições: o rio Negro, que banha a cidade, chegou à marca de 30,02 metros, o maior índice já registrado desde 1902. Quando lembramos que a cidade passou por duas ondas severas de Covid-19 no último ano, a situação fica mais séria e preocupante.

O que está acontecendo hoje em Manaus não nos deixa esquecer de maneira alguma que a crise climática é uma realidade e intensifica eventos extremos – e que já existem pessoas que estão pagando o preço por esses fenômenos. 

No país onde milhões passam fome, e tendo em vista que a região Norte está entre as mais impactadas, uma cheia dessas proporções agravou essa realidade. Por isso, unindo forças a ações humanitárias que estamos fazendo desde o ano passado, na última semana o Greenpeace realizou uma entrega de alimentos para famílias que vivem em regiões alagadas

Foram doadas 1 mil cestas básicas compostas de itens como arroz, feijão, óleo, café e macarrão. As doações somaram 10 toneladas de alimentos, destinadas a 440 famílias dos bairros Colônia Antônio Aleixo e Educandos, nas zonas Leste e Sul de Manaus – dois dos locais mais castigados pelas águas do rio Negro.   

“Esse tipo de ajuda é muito importante”, disse o autônomo Artêmio Souza Araújo, 47. Artêmio vende churrasco numa praça e sente dificuldades para comprar itens para o seu cardápio: “A situação alimentar das pessoas hoje está muito difícil. Tudo muito caro. Você vai fazer um ranchinho com R$ 50 e não dá nada. O feijão de praia eu comprava de quatro reais, agora sabe quanto está? Nove reais! Uma cesta dessa que vocês trazem ajuda muito. Tem gente que não tem nada”. 

Perdas

A Prefeitura de Manaus estima que mais de 8 mil famílias foram prejudicadas com a cheia do rio Negro, em 21 bairros diferentes. Ao todo  já foram construídos mais de 13 mil metros de pontes e aplicadas 20 toneladas de cal em diferentes locais – para diminuir o forte odor da água suja que entra nos becos e nas casas das pessoas.

A dona de casa Cíntia dos Santos Silva, 55, mora no bairro Colônia Antônio Aleixo. Sua casa possui dois andares – mas o primeiro deles foi completamente tomado pelas águas. Com isso, sua filha e três netos que moravam lá tiveram que se mudar de maneira emergencial para o andar de cima. Nesse processo foram perdidos cama, fogão, fogão industrial, mesa e geladeira.

“Além disso, são dez pessoas que moram aqui em casa. Hoje ninguém pode mais comer carne. O quilo do picadinho aqui pela vizinhança tá em R$ 25. Quando não temos nada ainda tentamos pescar, mas acontece de às vezes a gente não saber o que vai jantar”, disse Cíntia.

Atlântico aquecido 

Segundo o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Jochen Schongart, o aumento das cheias na Amazônia é uma consequência direta do aquecimento do Atlântico Tropical, a porção do oceano mais próxima da linha do Equador. 

“Com o Oceano Atlântico aquecido, os ventos que vêm do oceano vêm mais quentes e trazem mais umidade para a Amazônia. Essa importação de vapor de água é a causa desse tanto de chuvas e aumento de cheias que verificamos na região”, afirmou o cientista.

São três os grandes fatores que contribuem para este aquecimento, segundo o cientista. O primeiro são os ciclos naturais hidrológicos. “O Atlântico tem períodos mais frios e mais quentes e estamos hoje num desses períodos mais quentes”, explicou Jochen.

O segundo são as mudanças climáticas antropogênicas – ou seja, causadas pelo homem. A emissão de gases de efeito estufa faz com que um conjunto de ventos e águas oceânicas situados no sul da África “desça” em direção à Antártida. 

“Com isso abriu-se uma porta no sul da África que permitiu que águas superficiais quentes do oceano Índico vazem para o Atlântico, contribuindo mais ainda para o aquecimento do Atlântico. Isso significa mais vapor de água, mais umidade e mais chuvas na região da Amazônia”, disse Jochen.

Philip Fearnside, ecólogo que também atua como pesquisador no Inpa, reafirma a existência desse “vazamento” de água quente do oceano Índico para dentro do Atlântico e alerta: “É um fenômeno que tende a aumentar porque está ligado ao aquecimento global que está galopante, e é muito importante que o mundo chegue a uma mudança de comportamento para contornar isso.” 

O terceiro fator diz respeito à interação entre esses dois fenômenos – eles se retroalimentam e, assim, acabam ficando mais fortes, gerando eventos (como chuvas) ainda mais intensas.  

“O mais preocupante é que o Oceano Atlântico deve manter essa tendência de aquecimento nos próximos anos”, disse Jochen. “Então precisamos tomar providências para evitar que as populações da Amazônia continuem a sofrer com essas cheias severas; precisamos investir em adaptação e mudanças”.

O impacto na vida das pessoas

“Fenômenos como o que estamos vendo em Manaus não só castigam populações mais pobres e vulnerabilizadas, como impactam diversos aspectos das nossas vidas: dificultam a produção de alimentos, a geração de energia elétrica e a disponibilidade de água. Numa situação de pandemia como a que estamos vivendo, este é um cenário muito preocupante”, declarou o porta-voz da Campanha de Clima e Justiça do Greenpeace, Thiago Almeida.

Thiago contou que, além da cheia do rio Negro, existem diversas outras ocorrências que mostram que o clima do planeta vem sendo avariado de maneira irreversível – como as alagações ocorridas no Acre em fevereiro e a seca que atinge hoje o Centro-Sul do Brasil.

“Para reverter esta situação, precisamos acabar com o desmatamento na Amazônia, cuidar das nossas áreas protegidas, promover a restauração florestal, proteger as bacias hidrográficas e acelerar a transição energética para fontes renováveis”, disse o porta-voz.

Já existem soluções para a crise climática e que podem ajudar muito na resolução da crise econômica e social brasileira. Precisamos apenas ligar os pontos, contar com quem já está atuando junto e promover ações que contribuam para a construção de um mundo mais justo, inclusivo e em equilíbrio com o meio ambiente. Assine a nossa petição para se juntar ao movimento de pessoas que reconhecem a urgência da crise climática, dar voz às pessoas mais afetadas por este problema e manter-se informado para nos mobilizarmos pela causa e pressionarmos as autoridades.

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