Enquanto o Brasil está em chamas e sob fumaça, os bancos seguem financiando o agro destruidor que utiliza o fogo ilegalmente

A foto mostra uma propriedade financiada pelo crédito rural queimando no município de Cujubim, no estado de Rondônia.
Propriedade financiada pelo Crédito Rural queimando em Cujubim – RO. Crédito: © Marizilda Cruppe / Greenpeace

A natureza é nosso bem mais precioso e as interações que acontecem dentro dos biomas garantem a continuidade da vida, seja ela humana, animal ou das plantas. Ainda assim, ano após ano os biomas queimam, esses incêndios são em sua maioria iniciados pela ação humana, e um setor que até então tem passado despercebido nessa história é o financeiro. 

Bancos têm emprestado recursos financeiros, como o crédito rural, para produtores rurais envolvidos com queimadas criminosas, é o que mostrou o novo levantamento do Greenpeace Brasil, descrito abaixo. Ao fecharem os olhos diante de irregularidades socioambientais, os bancos se tornam parte do problema e assumem um papel importante no financiamento das atividades que destroem a natureza. 

Em abril, o Greenpeace Brasil lançou o relatório: “Bancando a Extinção: bancos e investidores como sócios no desmatamento”, onde denunciamos que devido a critérios insuficientes e processos falhos para a concessão de crédito, bancos públicos e privados vêm direcionando milhões em recursos, todos os anos, para fazendas envolvidas com desmatamento, queimadas, grilagem e conflitos fundiários. 

De um lado, quem tem dívidas encontra muita dificuldade para acessar um financiamento para comprar uma casa e ainda pode ter seu pedido negado. Do outro,  quem destrói nossos biomas e coloca fogo nas florestas e pastos, além de acumular milhões em dívidas ambientais, tem seu financiamento aprovado. É uma conta injusta que é possível devido às frágeis medidas de controle utilizadas pelas instituições financeiras para concessão de financiamento.

O Greenpeace Brasil fez um levantamento que aponta que 2.261 propriedades rurais foram financiadas com sobreposição de embargo ambiental (incluindo 12 tipos de infração):

Em ambos os casos, a maioria se deu no bioma Amazônia, embora a análise tenha considerado também o Cerrado e o Pantanal.  

Atualmente o Manual de Crédito Rural traz impedimentos ambientais, sociais e climáticos para a concessão de crédito, e no caso de embargos a restrição se aplica apenas se for embargo por desmatamento, deixando de fora uma série de outros tipos de embargos ambientais, como por exemplo o uso do fogo ou por impedir a regeneração. Por isso a restrição deveria ser mais ampla. O Greenpeace ainda defende que fazendas com ocorrência de fogo e de desmatamento sem autorização, ainda que não exista embargo, também não deveriam acessar crédito (já que os órgãos ambientais não dão conta de embargar tudo que é ilegal). 

O mapa elaborado pelo Greenpeace Brasil a partir dos dados coletados do IBGE, IBAMA e BACEN mostram o ponto central das 133 propriedades que foram embargadas por uso ilegal do fogo. São 122 propriedades localizadas na Amazônia e 11 propriedades no Cerrado.
133 propriedades rurais que receberam financiamento e que estão com embargos por uso ilegal do fogo localizadas na Amazônia (122) e Cerrado (11). Fonte: Elaborado pelo Greenpeace Brasil a partir dos dados do IBGE (2022); IBAMA (2024); BACEN (2024)

No mapa acima, as sinalizações de fogo ilegal são diminutas quando comparadas ao todo. Muitas das ocorrências são descritas como “degradação/destruição” sem especificar o uso ou não de fogo. Portanto, o resultado de apenas 133 embargos se referem à uma pequena fração em que foi devidamente sinalizado a prática de queima na ocorrência, podendo se tratar, portanto, de um resultado subestimado. Note que apesar do Pantanal ter sofrido com diversos incêndios criminosos em 2020 e em 2024, não há ocorrência de embargo por fogo. 

Instituições financeiras que concederam crédito em áreas embargadas por uso ilegal de fogo

Foram identificadas 353 operações totalizando R$ 68.276.530,51 em crédito concedido, sendo que 80% do crédito foi aplicado na Amazônia e 20% no Cerrado. As operações foram concedidas pelo Banco do Brasil (266), Banco da Amazônia (61), Banco do Nordeste (6), Cooperativas de Crédito (19) e Bradesco (1), ou seja, esses bancos estão financiando a destruição da natureza e propriedades multadas por uso do fogo de forma ilegal!

Dessas 85,5% dos embargos ocorreram antes do financiamento e 14,5% após, indicando a necessidade de monitoramento contínuo das propriedades financiadas ao longo da vigência do contrato, pois podem ocorrer irregularidades socioambientais. 

Os bancos deveriam considerar a restrição para quem tem qualquer tipo de infração ambiental, independente da fazenda financiada, incluindo embargo e/ou multa e em qualquer propriedade. Quem comete crimes ambientais não deveria acessar o crédito rural que conta com recursos do orçamento público e das pessoas.

Participe do abaixo-assinado e ajude a pressionar o sistema financeiro!

Desde o início do ano, estamos acompanhando como as mudanças climáticas têm impactado nossos biomas com longos períodos de estiagem, altas temperaturas, baixa ocorrência de chuva e secas extremas. Ao mesmo tempo, o agronegócio destruidor avança muitas vezes queimando ilegalmente e desmatando para extensão de atividades como a pecuária, milho, soja e algodão. No levantamento, o Greenpeace Brasil também identificou que:

Na Amazônia, 116 das 122 propriedades rurais financiadas e com embargo por uso ilegal de fogo queimaram pelo menos uma vez em 6 anos. Juntos, eles somam uma área queimada equivalente a 1,8 vezes o tamanho de Paris.

Já no Cerrado, 7 das 11 propriedades rurais financiadas e com embargo por uso ilegal de fogo queimaram pelo menos uma vez em 6 anos. Juntos, eles somam uma área queimada de 8.340 hectares, ou 11.914 campos  de futebol.

“Em um mundo onde os eventos climáticos extremos estão se tornando cada vez mais frequentes, é urgente que os bancos parem de financiar quem desmata, faz uso ilegal do fogo e carrega infrações ambientais em seu nome. No Brasil, o desmatamento e as queimadas contribuem com 58% das emissões de gases que aquecem o planeta, contribuindo assim com um clima mais instável marcado por secas severas, que por sua vez facilitam a ocorrência de grandes incêndios. O setor financeiro deve estabelecer travas para parar de alimentar esse ciclo vicioso “, diz a coordenadora de Florestas do Greenpeace Brasil, Cristiane Mazzetti.

No relatório “Bancando a Extinção”, o Greenpeace apresentou uma série de demandas às instituições financeiras e as situações acima reforçam a importância da rápida adoção das demandas. Destacamos aqui que os bancos devem:

  • Verificar antes da concessão do crédito e periodicamente o cumprimento dos critérios socioambientais e se, constatado descumprimento, suspender a concessão e/ou liquidar antecipadamente a operação;
  • Proibir a concessão de crédito para imóveis rurais que tenham usado fogo de maneira ilegal;
  • Quando identificado desmatamento, solicitar a apresentação da Autorização para Supressão de Vegetação (ASV);
  • Incluir em seus critérios de concessão de crédito rural, a restrição para tomadores que tenham qualquer tipo de infração ambiental em seu nome e propriedades, seja embargo ou multa e promover ou exigir a rastreabilidade quando o financiamento for destinado à pecuária.

O nosso suado dinheirinho que paga os impostos e taxas bancárias pode financiar as propriedades rurais que utilizam fogo de maneira ilegal. Assine a petição e participe da campanha “Bancando a Extinção” que exige que os bancos parem de financiar desmatadores.

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