Pecuarista tem 11 fazendas, dentre elas a “Soberana”, multada por desmatamento, mas beneficiada com quatro operações de crédito rural concedidas pelo BB entre 2021 e 2022; Fazenda também forneceu gado para a JBS.

Ativistas protestam contra o financiamento do desmatamento em Brasília | Foto: © Tuane Fernandes / Greenpeace

Um levantamento realizado pelo Greenpeace Brasil, com base em dados públicos realizado, revela que o Banco do Brasil concedeu mais de R$ 10 milhões em crédito rural ao fazendeiro Claudecy Oliveira Lemes, acusado de utilizar ilegalmente em suas fazendas no Pantanal agrotóxicos desfolhantes (como a substância 2,4-D, componente do “agente laranja”, utilizado na Guerra do Vietnã) para a prática de desmatamento químico de vegetação nativa. A investigação também revela que o fazendeiro forneceu gado para a JBS entre 2020 e 2023.

O caso de Claudecy veio à tona após uma reportagem veiculada no programa Fantástico, da Rede Globo, em 14 de abril, que chamou a atenção do Greenpeace Brasil.

Dias antes da reportagem, o Greenpeace havia lançado o relatório “Bancando a Extinção: bancos e investidores como sócios no desmatamento”, que denuncia como a falta de controle adequado dos bancos na concessão de crédito rural beneficia produtores rurais envolvidos com desmatamento, grilagem e demais irregularidades socioambientais e cobra que o sistema financeiro estabeleça, entre outras ações, o monitoramento contínuo das áreas financiadas.

Ao apurar a origem dos recursos financeiros de Claudecy, o Greenpeace Brasil identificou que o pecuarista recebeu crédito rural pelo Banco do Brasil (BB), que no mês passado também foi alvo de protesto do Greenpeace Brasil.

Claudecy Oliveira Lemos é proprietário de 11 fazendas no Pantanal, no município de Barão de Melgaço. Durante o levantamento, uma das fazendas em especial levantou um alerta. Trata-se do imóvel rural “Fazenda Soberana”, que, em resumo, apresenta:

  • Auto de infração e embargo por desmatamento ilegal em área de 1.370 hectares aplicado pelo órgão SEMA/MT e lavrado em 2020, com multa de R$ 6.853.650,00 (seis milhões, oitocentos e cinquenta e três mil e seiscentos e cinquenta reais);
  • Quatro financiamentos – que juntos somam mais R$10 milhões – concedidos pelo Banco do Brasil entre março de 2021 e março de 2022, ainda vigentes;
  • Venda de gado para a JBS em 2021, mesmo após a fazenda ser embargada por desmatamento;
  • Indícios de uso ilegal do fogo em 2023, com registro área queimada estimada em 2.500 hectares dentro dos limites da fazenda.

Em um dos autos de infração emitidos em 2023 pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente/MT (Auto de Infração nº 1369000223), embora fosse para outra fazenda, na descrição a “Fazenda Soberana” também aparece como receptora dos agrotóxicos possivelmente utilizados para a prática de desmate químico realizado nas fazendas vizinhas, todas de Claudecy.

Créditos do Banco do Brasil (BB) para fazenda com embargo

Segundo os dados apurados pelo Greenpeace, o pecuarista Claudecy acumula quatro contratos de crédito rural que juntos somam um total de R$ 10.017.840,00 (dez milhões, dezessete mil e oitocentos e quarenta reais), com vencimentos entre 2027 e 2029. Todos eles foram concedidos pelo BB entre 2021 e 2022 à “Fazenda Soberana”, propriedade rural multada por desmatamento ilegal pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente/MT em 2020. 

Em 2021, o BB concedeu três empréstimos a Claudecy para aquisição de 3 mil cabeças de gado. Em 2022, um novo empréstimo do BB foi concedido para a aquisição de um avião. 

Além da “Fazenda Soberana”, outras quatro fazendas de Claudecy no Pantanal foram objeto de embargo da SEMA/MT. Sete autos de infração foram registrados nessas propriedades rurais entre 2017 e 2021. No total, esses autos somam R$37.896.944,00 (trinta e sete milhões, oitocentos e noventa e seis mil e novecentos e quarenta e quatro reais)  em multas aplicadas.

“Diante do tamanho dos danos ambientais causados por Claudecy, seja com o suposto uso dos agrotóxicos para o desmate químico, seja pelas demais irregularidades socioambientais em suas fazendas, o Banco do Brasil deve cancelar as operações de crédito vigentes e liquidar o empréstimo antecipadamente, tanto para se alinhar as regras atuais do Manual do Crédito Rural, como para evitar a continuidade dos prejuízos causados pelo fazendeiro”, recomenda a porta-voz da campanha de florestas do Greenpeace Brasil, Thais Bannwart.    

O BB é um dos bancos mencionados no relatório “Bancando a Extinção: bancos e investidores como sócios no desmatamento”. Ele é um dos principais financiadores do crédito rural.

Venda de gado para a JBS

Os dados apurados pelo Greenpeace Brasil também mostram que, mesmo um ano após ser embargada por desmatamento ilegal, a “Fazenda Soberana” forneceu gado para a empresa JBS do município de Pedra Preta (MT) em 2021. Importante ressaltar que a fazenda se encontrava embargada pelo órgão estadual quando a compra foi realizada, mas isso não impediu a JBS de finalizar a transação.

“Antes de realizar a compra, a JBS tinha como saber que a fazenda estava embargada. Mais que isso, a empresa deveria buscar essa informação para cumprir com a sua própria política de compra, que afirma que o frigorífico não adquire animal de imóveis rurais com desmatamento não autorizado em todos os biomas a partir de 01/08/2019”, explica a coordenadora da campanha de florestas do Greenpeace Brasil, Cristiane Mazzetti.

Claudecy vendeu outros 106 lotes de gado para a JBS entre março de 2020 e maio de 2023 de uma outra fazenda. Apesar dela não ter embargos, chama a atenção que a “Fazenda Soberana” está distante apenas 128 km dessa fazenda e, na pecuária, é comum a prática de “lavagem de gado”, uma estratégia usada para driblar a fiscalização e o controle das cadeias de abastecimento, repassando os animais dos imóveis irregulares para os imóveis regulares antes de chegar ao frigorífico.

Demandas

No relatório “Bancando a Extinção: bancos e investidores como sócios no desmatamento”, o Greenpeace Brasil traz uma série de demandas às instituições financeiras e aos seus reguladores, que, se adotadas, podem prevenir que financiamentos como os de Claudecy ocorram. 

Dentre as demandas está que os bancos devem verificar antes da concessão do crédito e periodicamente o cumprimento dos critérios socioambientais e se, constatado descumprimento, suspender a concessão e/ou liquidar antecipadamente a operação; Vedar a concessão de crédito para imóveis rurais que tenham usado fogo de maneira ilegal e solicitar a rastreabilidade da pecuária e apresenação da Autorização para Supressão de Vegetação (ASV) caso haja desmatamento após julho de 2008. Confira todas as demandas para o sistema financeiro:

Relatório Bancando a Extinção
Sumário Executivo

Assine o abaixo-assinado “Bancando a Extinção”

A sociedade não compactua com o desmatamento e com a destruição do Pantanal, da Amazônia e nem do Cerrado e não deseja que dinheiro seja destinado para atividades que ajudem a consolidar um cenário de clima instável e extinção.

Quem banca essas atividades também é responsável pelo problema. Precisamos de mudanças urgentes no sistema financeiro.

Nos ajude a pressionar os bancos para que cumpram as regras atuais na concessão de crédito rural e implementem medidas mais rigorosas para interromper imediatamente o direcionamento de recursos para quem desmata e causa danos à biodiversidade, ao clima, aos povos tradicionais e ao nosso futuro.

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