Em sua última ação de julho, a campanha Agroecologia contra a Fome levou 200 cestas de alimentos da agricultura familiar para a Terra Indígena Sororó e duas aldeias vizinhas

A história se repete. O povo Suruí Aikewara tinha seu roçado. E dele praticamente vivia, com algum complemento aqui e ali. Na época certa, todo ano, plantavam. Usando sua sabedoria ancestral de cultivar e preservar para nunca faltar. Com o tempo, e a cada ação dos kamará (como os Suruí chamam os não índios), esse equilíbrio foi bambeando. Sua sagrada terra parou de dar o suficiente. Caça e pescado também começaram a rarear. Tudo parecendo até castigo dos deuses. Mas os motivos, sabemos, têm bem mais a ver com a terra do que com o céu. “Eles sofrem muitos impactos. Estão perdendo os animais de caça, que são atropelados, mortos. Também sofrem impactos referentes à questão das mineradoras, que atravessam a Terra Indígena (TI) com essa carga pesada de minérios, e vão poluindo. As fazendas que estão ao redor de toda a TI usam o agrotóxico, que prejudica a polinização das castanheiras, porque acaba com as abelhas… Enfim, é um povo que resiste e luta pelo seu direito à existência”, conta Irmã Zélia, 60, integrante da equipe do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) de Marabá, grande parceiro dos Suruí Aikewara.

Com seu território cortado ao meio, de Norte a Sul, pela BR-153, o povo Suruí Aikewara foi marcado pela Guerrilha do Araguaia, que aconteceu na região durante a ditadura militar. Cada vez mais cercado por fazendas que desmatam a floresta, asfixiado pela nebulosa fumaça de incêndios criminosos, comercialização ilegal de madeira, grilagem, garimpo e desmonte da FUNAI, o povo Suruí tem sua coragem e resistência postas à prova de sol a sol.

Direito à existência

A população da TI Sororó está contando com doações para sobreviver à pandemia © Nieves Rodrigues/Greenpeace

“Há 500 anos que não é fácil. Mas agora vemos um governo que fala na cara dura, nos discursos, o que quer para a população indígena, os ribeirinhos, as minorias, a classe pobre. Eles querem derrubar tudo, pisar em cima das populações indígenas”, critica Saruahi Suruí, o Sarú, 35, vice-cacique e educador da aldeia Yetá.

“Todos nós fomos acometidos com essa doença [Covid-19]. E no fim do ano passado, que era época de plantar, as pessoas estavam debilitadas. Eu, por exemplo, não consegui ser a mesma pessoa que antes”, lamenta o cacique Welton Suruí, 34, da Aldeia Ytahy. 

“Nós tivemos perdas incalculáveis. Cinco de nossos guerreiros, que são meus tios, não resistiram. Eles que nos ensinavam tudo sobre nossa cultura, estavam no nosso dia a dia praticando nossos rituais. Foram para Marabá e não voltaram com vida”, conta Welton.

“O pajé que cura, que salva, que liberta o povo, não tem mais essa figura. Percebemos o crescimento do pentecostalismo dentro das aldeias. A gente não vê eles com seus rituais, com seus cantos, suas músicas, a pintura cultural. Vemos o culto… É o avanço de uma religião que não cria nas pessoas motivação para que não percam as suas raízes culturais”, problematiza Irmã Zélia.

Comida de verdade para os Suruí Aikewara

Diante desse cenário de tanta fragilidade, a campanha Agroecologia contra a fome, do Greenpeace, juntou-se ao CIMI e ao MST, e realizou a doação de 4 toneladas de alimento da agricultura familiar para 7 aldeias Suruí Aikewara (Sororó, Yetá, Ytahy, Awassehe, Tukapehy, Ipirahy, Akamassiron) e para dois povos situados em aldeias próximas – os Guarani, de Nova Jacundá, e os Atikum, da Kanaí. 

Com esse trabalho conjunto, 200 cestas compostas de feijão, banana, abacaxi, laranja, cupuaçu, mamão, milho, abóbora, batata, ovos, farinha, pão e queijo, levaram saúde e esperança para mais de 700 indígenas da região.O MST, com a ajuda de Alan Leite, 27, membro da coordenação estadual, e de outros companheiros, fez a ponte com os assentamentos 26 de março e Palmares II para obtenção dos alimentos. “Tem que fazer tudo, o mapeamento dos alimentos, a colheita, buscar, lavar, embalar… Quando vamos fazer doações para os indígenas, sempre procuramos o CIMI. Sempre estamos nas lutas juntos.”, conta Alan.

O CIMI atuou em toda a logística para organizar o transporte e a doação dos alimentos nas aldeias. “A entrega das cestas também foi um momento em que os indígenas perceberam o que mais marcou: a identificação que tiveram com a luta do movimento sem terra, dos pequenos agricultores. Eles também são aqueles que lutam para garantir seu território, sua terra. Essa foi a grande lição desse dia”, reflete Zélia.

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